domingo, 24 de março de 2013

Favelas: um mercado em potencial

Consumo nas periferias triplicou nos últimos dez anos, revela pesquisa A periferia das cidades não é mais a mesma. Em dez anos, as favelas se transformaram num mercado potencial de consumo. São 12 milhões de pessoas concentradas nas comunidades que formam um cinturão em torno das grandes metrópoles brasileiras. É quase a população de 11,2 milhões de São Paulo, a maior cidade do país. Elas movimentam uma renda de R$ 56 bilhões anuais, equivalente a todas as riquezas produzidas na Bolívia. 
    
De olho na freguesia que tem dinheiro e paga quase sempre à vista, as empresas buscam parceiros para colocar os seus produtos nas prateleiras. São lojas multimarcas de roupas e acessórios eletrônicos, mercadinhos com produtos importados, salões de beleza recheados dos mais refinados produtos e cosméticos. É a nova classe média ávida por bens duráveis de qualidade. 

A pesquisa Favelas brasileiras - Um mercado de R$ 56 bilhões do Data Popular/Data Favela comprova a mobilidade social das famílias impulsionada pela oferta de mais emprego, melhoria da renda e o aumento da escolaridade. A maioria dos moradores se situa na nova classe média, cuja renda familiar per capita varia de R$ 291 aR$ 1.019, segundo os critérios da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). 

O estudo revela que o consumo triplicou nos últimos dez anos (2002-2013) na periferia do país. “É a nova classe média que cresceu mais nas comunidades. Tem uma fatia maior no Sudeste, mas está presente em todas as regiões do país”, diz Renato Meirelles, diretor do Data Popular. A  média de anos de estudo também aumentou: passou de quatro para seis anos. “É uma geração mais escolarizada, que tem a chance de consumir mais do que os pais. Eles querem bens de qualidade e estão sempre consumindo produtos”, arremata o diretor.  

No novo mercado de consumo, os jovens despontam como o ator principal. Acesso ao computador e à internet, presença nas redes sociais, popularização da TV a cabo, celular de toque, tablets e smartphones. Além do consumo de marcas e visitas às lanchonetes fast food. “O morador da favela quer capitalizar isso nas marcas que ele usa. A aspiração não é se igualar, mas ser visto pelo asfalto”, comenta Meirelles. 

"Os jovens hoje têm celular e notebook. Mas eu quero fazer um curso universitário", diz Manoela Bárbara de Moraes
Diario visitou duas comunidades - Chão de Estrelas e Muribeca - incluídas na pesquisa pela Central Única das Favelas (Cufa). Manoela Bárbara Medeiros de Moraes, 19 anos, nasceu e cresceu em Chão de Estrelas, periferia do Recife. Para ela, as mudanças na comunidade com a oferta de cursos profissionalizantes criou novas perspectivas para os adolescentes, reduzindo os índices de violência.

“A gente sente que cresceu o consumo. Os jovens hoje têm celular, notebook com acesso à internet e televisão de tela plana em casa. Acho importante, mas tenho outros desejos. Quero fazer um curso universitário de jornalismo ou enfermagem”, planeja. 

Amizael Cícero da Silva vendia peixe de porta em porta. Ele sentiu o potencial de consumo local e abriu um mercadinho (Bernardo Dantas/ DP/D.A Press)
Amizael Cícero da Silva vendia peixe de porta em porta. Ele sentiu o potencial de consumo local e abriu um mercadinho
A comunidade de Chão de Estrelas tem cerca de 7 mil moradores. O comércio local reflete o poder de compra das famílias. Morador da comunidade, Amizael Cícero da Silva, 37 anos, vendia peixe de porta em porta. Ele sentiu o potencial de consumo dos vizinhos e, há dois meses, abriu o mercadinho Central das Compras. Não se arrepende. “Graças a Deus o movimento é muito bom. Aqui o cliente quer produto de boa qualidade e bom atendimento.”

A comunidade de Casinhas-Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, é o retrato do consumo emergente. Lá moram cerca de 12 mil potenciais consumidores. Basta caminhar um pouco pelas ruas para perceber a efervescência econômica da comunidade. Falta calçamento e em alguns trechos das ruas os esgotos aparecem a céu aberto. Mesmo sem infraestrutura urbana, a maioria das casas está em reforma ou foi ampliada. 

Os armazéns de construção fazem a festa. As lojas de móveis e eletrodomésticos também comemoram o dinheiro em movimento. “Todas as empresas têm interesse nesse novo público que começou a consumir nos últimos cinco anos”, comenta Celso Cronenbold, coordenador da Central Única das Favelas (Cufa) em Pernambuco. 

A família de Danilis Oliveira, 19 anos, pegou o embalo e começou a reforma da casa em julho do ano passado. O aumento da renda dos pais - a mãe é empregada doméstica e o pai é vigilante - contribuiu para a mexida na casa. Danilis ganhou a etapa estadual do concurso de modelo Top Cufa. “Viajei pela primeira vez para o Rio de Janeiro de avião. Conheci novas pessoas e tenho possibilidades de ser contratada por uma agência de São Paulo. Depois, quem sabe, vou para o exterior.”   

"O bairro se desenvolveu, tem mais emprego e renda", garantem Edilton Santana e Maria José da Silva, que mora na comunidade há 31 anos
O casal de aposentados Edilton Santana e Maria José da Silva mora na comunidade há 31 anos. Eles acompanharam as mudanças que ocorreram na Muribeca. A família saiu do conjunto residencial da antiga Cohab e comprou uma casa na Rua 3, Quadra 3, em Casinhas. “É espantoso a destruição e reconstrução da comunidade. O bairro se desenvolveu, tem mais emprego e renda”, comprova o aposentado.

A casa ampliada tem três pavimentos. O terceiro andar é um terraço com vista para a Zona Sul de Recife. “Aqui a gente vai fazer churrasco e comemorar as festas de Natal e ano-novo”, planeja o casal. Dona Maria José se orgulha ao mostrar os móveis novos e os eletrodomésticos comprados no cartão de crédito. Ainda falta alguma coisa? “Trocar o sofá e comprar um rack para a televisão da sala”, sonha a dona de casa.

Pernambuco.com

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